Redakcja Polska

Ecos de Chopin no Brasil: uma polonidade que não se apaga

08.12.2025 14:45
Estima-se que cerca de 5 milhões de brasileiros tenham origem polonesa, resultado de um movimento migratório que se intensificou entre o final do século XIX e o início do XX. Já em 1824, no atual estado do Rio Grande do Sul, registrou-se a chegada de famílias polonesas com sobrenomes como Białek, Bilski, Gudowski, Pokorny. Esses e outros grupos faziam parte de um fluxo migratório majoritariamente germânico proveniente da Pomerânia, então sob domínio prussiano, resultando numa subnotificação de imigrantes poloneses no Brasil. O mesmo processo foi observado em outros estados brasileiros, como Santa Catarina e Espírito Santo.
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O avanço dessa imigração dialogava com mudanças políticas no Brasil Império. À medida que a escravidão passava a ser contestada no cenário internacional, o país buscava alternativas para ocupar seu vasto território e estimular a agricultura, ignorando assim as populações indígenas que já estavam aqui presentes há milênios. Nesse contexto, ideias racistas provenientes da Europa reforçaram o interesse por políticas de “branqueamento” da população, ao mesmo tempo em que camponeses sem terra do continente eram encarados pelos governantes como a solução para o povoamento e a defesa de fronteiras.

Um marco desse processo foi o Decreto nº 3.784, de 19 de janeiro de 1867, que regulamentou a criação de colônias agrícolas e definiu a infraestrutura necessária para receber imigrantes, como estradas, pontes e alojamentos provisórios. A norma também estabeleceu tamanhos e preços dos lotes rurais — de 151 mil m² a 605 mil m² — e urbanos, que variavam entre 1.000 e 5.000 m². Na prática, o tamanho das propriedades oscilou de acordo com políticas provinciais. Os primeiros imigrantes alemães, por exemplo, receberam gratuitamente terrenos de cerca de 75 hectares, enquanto italianos receberam glebas de aproximadamente 25 hectares. Muitos poloneses, sobretudo no Rio Grande do Sul, acabaram instalados em áreas menores, por volta de 12,5 hectares, pelas quais precisaram pagar.

Além da terra, imigrantes podiam solicitar empréstimos para garantir a subsistência inicial e recebiam sementes e ferramentas. O valor desses auxílios era somado ao custo do lote, que podia ser quitado à vista, parcelado em cinco vezes com acréscimo de 20% ou pago por meio de serviços prestados ao governo. Essa última modalidade foi frequente entre poloneses: cada adulto podia trabalhar por até seis meses na derrubada da mata, abertura de estradas e construção de pontes e casas. O trabalho de menores de idade também era autorizado, sendo que dois adolescentes equivaliam a um trabalhador adulto para fins de cálculo.

Camponeses poloneses trabalhando na abertura de estradas no sul do Brasil Fonte: Kazimierz Głuchowski, 1927) Camponeses poloneses trabalhando na abertura de estradas no sul do Brasil Fonte: Kazimierz Głuchowski, 1927)
Instalações para abrigar provisoriamente os imigrantes na colônia Senador Correia, atual município de Prudentópolis, no estado do Paraná (Fonte: Kazimierz Głuchowski, 1927). Instalações para abrigar provisoriamente os imigrantes na colônia Senador Correia, atual município de Prudentópolis, no estado do Paraná (Fonte: Kazimierz Głuchowski, 1927).

Essas políticas moldaram o perfil das colônias agrícolas brasileiras e contribuíram decisivamente para a formação da numerosa comunidade de descendentes de poloneses que vive hoje no país.

Foram décadas de provações, mas foi no Brasil que muitos camponeses poloneses finalmente encontraram a possibilidade de viver em liberdade e realizar um sonho que, em sua terra natal, parecia inalcançável: o de possuir a própria terra.

Convém lembrar que, desde o final do século XVIII, a Polônia teve seu território ocupado e repartido entre o Império Russo, o Império Austro-Húngaro e o Reino da Prússia, recuperando sua independência apenas 123 anos depois, com o fim da Primeira Guerra Mundial.

Hoje, a comunidade polonesa no país é formada majoritariamente por brasileiros que já chegam à quinta, sexta ou sétima geração. O mais surpreendente é que, apesar do tempo e da distância, essas famílias preservam tradições, costumes e até a língua trazida pelos antepassados — idioma que, inclusive, ganhou status de cooficial ao lado do português em vinte municípios brasileiros.

A cultura e as tradições mantidas pelos brasileiros descendentes de poloneses frequentemente trazem adaptações locais e incorporações de elementos da cultura brasileira — incluindo influências indígenas e africanas — perceptíveis, por exemplo, na culinária e no vocabulário do polonês falado no Brasil, que apresenta particularidades e diferenças em relação à língua padrão utilizada na Polônia contemporânea.

Ao preservar sua herança cultural, esses descendentes não pretendem criar enclaves nem se isolar da nação brasileira. Pelo contrário, evocam a história e a memória de seus antepassados com profundo respeito e reconhecimento ao Brasil que os acolheu — país ao qual também deram contribuição expressiva, como a introdução do cultivo da soja, o desenvolvimento de técnicas de arquitetura em madeira, a adoção do carro de boi de quatro rodas, o desenvolvimento da medicina, da dança e teatro contemporâneos, além de diversos elementos culturais e culinários.

O resultado é uma simbiose étnica e cultural que caracteriza o Brasil em toda a sua diversidade. Em suma, cada brasileira e cada brasileiro possui uma origem étnica, e recordá-la ou celebrá-la não significa promover ideias supremacistas, mas, ao contrário, reconhecer e valorizar a fusão de culturas que constitui o próprio fundamento da identidade brasileira.

A diáspora polonesa no Brasil tem ainda uma característica singular: ela inclui pessoas de diversas origens étnicas — descendentes de italianos, alemães, africanos, portugueses e tantas outras etnias. Esse fenômeno ímpar, floresceu porque o Brasil é, por essência, multiétnico e multicultural. Em regiões onde mais de 90% da população tem ascendência polonesa, a cultura dos imigrantes se tornou tão presente que passou a funcionar como cultura regional. Assim, não causa espanto encontrar um descendente de italianos falando polonês, ou um brasileiro de origem alemã usando um português marcado por sotaque polonês. Nas colônias, essa convivência virou paisagem cotidiana.

Assentamentos agrícolas poloneses no sul do Brasil no final do século XIX (Fonte: Wacław Siemiradzki, 1899) Assentamentos agrícolas poloneses no sul do Brasil no final do século XIX (Fonte: Wacław Siemiradzki, 1899)

Entre os traços mais fortes dessa diáspora está o profundo sentimento de pertencimento à Polônia — um vínculo que desafia o tempo e a lógica. Todos os imigrantes sentem saudades de sua terra natal, mas, no caso dos poloneses que chegaram ao Brasil entre o século XIX e o início do XX, surgiu algo mais intenso: uma Polônia idealizada, quase mítica. Paradoxalmente, essa memória afetiva convive com histórias duras, muitas vezes traumáticas, marcadas por perseguições, fome e instabilidade política. Entre os que atravessaram o oceano havia participantes de grandes revoltas armadas que visavam à recuperação da independência da Polônia, como o Levante de Novembro (1830-1831), Levante de Janeiro (1863-1864) e o Levante de Łódź (1905), homens e mulheres fugindo de guerras, ocupações e repressões.

Eles conquistaram no Brasil o direito à terra — mas perderam o direito de voltar para casa. A maioria jamais reviu a Polônia ou os familiares que lá permaneceram. Assim nasceu uma saudade que não se limita a uma geração: uma dor que se transmite como herança. Muitos poloneses na Polônia atual desconhecem essa história e se surpreendem ao perceber o tamanho da ligação afetiva que brasileiros separados por quase dois séculos de história, ainda cultivam com a terra de seus ancestrais. Mas talvez a explicação esteja no próprio caráter polonês — na teimosia, na resistência, na recusa a ser apagado. A história da Polônia ensina que sua nação não pode ser silenciada: quando tentam sufocar sua língua, sua cultura ou sua fé, nasce uma força que resiste e insiste em existir.

Vista aérea do município brasileiro de Carlos Gomes, onde mais de 90% da população possui ascendência polonesa (Foto: Prefeitura Municipal de Carlos Gomes) Vista aérea do município brasileiro de Carlos Gomes, onde mais de 90% da população possui ascendência polonesa (Foto: Prefeitura Municipal de Carlos Gomes)

Comemorações do dia da independência da Polônia em Carlos Gomes (Foto: Prefeitura Municipal de Carlos Gomes) Comemorações do dia da independência da Polônia em Carlos Gomes (Foto: Prefeitura Municipal de Carlos Gomes)

Tenho a convicção de que Fryderyk Chopin entenderia profundamente esse sentimento compartilhado pelos poloneses do Brasil. No exílio, ele próprio viu-se impedido de voltar à Polônia, e transformou essa impossibilidade em música. Sua obra é tecido de nostalgia, de amor ferido, de memória afetiva — exatamente o que forma o núcleo da polonidade brasileira. Assim como os camponeses que cruzaram o Atlântico, Chopin carregou uma pátria que só existia dentro de si, recriada em cada melodia.

Monumento em homenagem ao compositor polonês Fryderyk Chopin na Praia Vermelha w Rio de Janeiro (Foto: Halley Pacheco de Oliveira /  Wikimedia Commons) Monumento em homenagem ao compositor polonês Fryderyk Chopin na Praia Vermelha w Rio de Janeiro (Foto: Halley Pacheco de Oliveira / Wikimedia Commons)

Tanto Chopin quanto a Polonia brasileira foram privados de sua terra. E a conexão com aquilo que nos é arrancado — e não simplesmente deixado para trás — sempre dói mais fundo. A comunidade polonesa no Brasil encontrou uma forma de enfrentar essa perda: preservando a língua, a culinária, os rituais religiosos, as danças, o folclore e tudo aquilo que mantivesse acesa a memória de um país distante. O Brasil tornou-se também pátria — uma pátria que acolheu, permitiu reconstruir e deu espaço para que a identidade brasileiro-polonesa florescesse livremente.

Assim como nas melodias de Chopin, a comunidade polonesa no Brasil carrega uma fusão intensa de dor, resistência e esperança — sentimentos moldados por vivências pessoais e trajetórias coletivas construídas em solo brasileiro. A diáspora polonesa no país reúne pessoas talentosas, movidas por um vínculo afetivo e um patriotismo genuíno em relação à Polônia — sentimentos que se perpetuam ao longo de gerações. Trata-se de um potencial humano significativo, que merece pleno reconhecimento e valorização.

Quem sabe a autenticidade polonesa que vibra na música de Chopin possa, enfim, nos inspirar a reconhecer e valorizar a comunidade polonesa que pulsa no Brasil.

Dr Fabricio Nazzari Vicroski

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